O número de candidatos nas eleições e a ameaça ao pluralismo político
Bruno Cezar Andrade de Souza1
Muito se fala no grande número de candidatos que colocam seus nomes na disputa eleitoral. Realmente, há um excesso de candidatos se considerarmos as cadeiras em disputa. Tal fato ganha maior relevância devido aos prazos curtos que a Justiça Eleitoral tem para o julgamento dos processos de registro de candidaturas.
A quantidade de candidatos é grande graças à lei que delimita o número máximo que cada partido político, concorrendo isoladamente, ou a coligação partidária pode trazer como seus representantes na disputa eleitoral.
A Lei nº 9.504 de 1997 prevê que cada partido político dispute as eleições com mais candidatos do que os cargos em jogo (ou a serem preenchidos). Isoladamente, pode concorrer com uma vez e meia o número de vagas. Já a coligação, com o dobro de candidatos. É por isso que existe essa infinidade de candidatos concorrendo ao pleito, o que pulveriza recursos, aumenta o tempo de propaganda eleitoral no rádio e na televisão e dificulta a compreensão dos eleitores acerca das plataformas de campanha dos candidatos.
A dificuldade de identificação do eleitorado com seus candidatos provoca um distanciamento da população em relação à política. Em sua maioria, os eleitores não acompanham a atuação do parlamentar que obteve seu voto e, por conta dele, conseguiu ser eleito.
A pulverização das propagandas por vários candidatos é a causa do surgimento dos denominados candidatos puxadores de voto, geralmente, pessoas famosas, sejam artistas, esportistas ou políticos, já bastante conhecidos pela população. Isso porque, considerando o curto tempo de participação nas principais mídias de divulgação de suas candidaturas, o candidato que goza previamente de maior prestígio e conhecimento de seu nome pelo eleitorado obtém vantagem na disputa eleitoral em relação aos demais concorrentes. Isso leva os partidos políticos a priorizarem suas candidaturas porque, como as agremiações partidárias precisam de muitos votos para assumir mais cadeiras nas casas legislativas, tais candidatos, além de conseguirem os votos necessários para sua própria eleição, impulsionam e potencializam os ganhos de seu partido, que, por sua vez, elege mais candidatos sem que estes tenham votação tão expressiva quanto o puxador de voto.
O elevado número de candidatos e a escolha dessas figuras conhecidas do grande público guardam relação com o estabelecimento do coeficiente partidário e eleitoral nas eleições proporcionais previsto na legislação eleitoral. Com a definição do quantitativo de votos para cada vaga a ser assumida e com a necessidade de que o partido político atinja um determinado número de votos para ocupar uma quantidade de cadeiras, é necessário, por vezes, lançar mão de vários candidatos para que, embora sem condições de serem eleitos, os votos dados a eles contribuam para compor o quantitativo necessário para que a agremiação partidária obtenha uma vaga.
A título de exemplo, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral, nas últimas eleições municipais realizadas no ano de 2012, foram registrados em todo o Brasil o total de 449.800 candidatos ao cargo de vereador para 57.416 vagas nas câmaras municipais. Isso representa mais de sete candidatos por cada vaga. Em cidades com grande eleitorado, o cenário é ainda mais drástico, visto que existem mais vagas a serem ocupadas.
Essa situação gera grandes problemas, sobretudo, no resultado das eleições. Com tantos candidatos e com o calendário para julgamento dos registros de candidaturas tão reduzido, vários concorrentes chegam ao dia do pleito com sua situação processual ainda indefinida. Assim, pode acontecer de o eleitor votar em uma pessoa que pode ser considerada posteriormente inapta à disputa eleitoral ou a assumir mandato eletivo.
Há soluções simples de serem implementadas e que podem melhorar a disputa eleitoral. A mera redução do quantitativo de candidatos que os partidos têm direito de indicar para disputar às eleições já proporcionaria uma melhora.
Há fundamentação constitucional para a redução do número de candidatos que podem concorrer ao pleito. As regras que atualmente vigoram, pelo contrário, podem provocar o desrespeito a um dos princípios fundamentais em que se pauta a república federativa do Brasil, qual seja, o pluralismo político, previsto no inciso V do artigo 1º da Constituição da República Federativa do Brasil.
Com base em tal fundamento, o Supremo Tribunal Federal já teve a oportunidade de declarar inconstitucional o que se denominou como “cláusula de barreira” ou “cláusula de desempenho” quando, ao analisar a Ação Direta de Inconstitucionalidade-ADIn nº 1.351, definiu que não se pode criar mecanismo tendente a abolir o pluralismo político previsto em nossa Carta Magna.
Nesse sentido, o atual regime de escolha de candidaturas às casas legislativas tende ao desrespeito das minorias quando permite aos partidos políticos a disputa dos cargos com mais candidatos do que as vagas a serem preenchidas. Isso porque, ainda que pouco provável, é possível a eleição de candidatos de um único partido para compor as câmaras ou assembleias. Ou seja, não é dada às minorias sequer a chance de aguardar uma eventual suplência visto que, caso tenha conseguido votos suficientes para ocupar todas as cadeiras, nenhum outro partido logrou tal êxito. Com isso, perpetua-se por todo o período do mandato parlamentar um único pensamento político.
Por tais razões, defendemos a proposta de que cada partido político ou coligação só possa indicar candidatos até a metade das vagas em disputa. Com tal alteração, necessariamente, as casas legislativas serão compostas de forma pluripartidária. Ademais, será melhor o diálogo dos candidatos com o eleitorado que, embora tenha menos opções de escolha, poderá conhecer de fato as propostas de cada candidato e escolher seu representante com mais segurança. Conjugada com a antecipação do prazo para registro de candidaturas, ainda permitirá que sejam definidas as situações dos candidatos com antecedência necessária para que os eleitores votem efetivamente em candidatos aptos a representá-los.
1 Pós-graduado em Direito Eleitoral pela Universidade Cândido Mendes e graduado em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. É servidor do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, onde exerce suas atividades há seis anos na Corregedoria Regional Eleitoral.