Financiamento dos partidos e campanhas eleitorais

dinheiro e moedas

Roselha Gondim dos Santos Pardo1



Tema recorrente na política brasileira é se as campanhas devem ser financiadas exclusivamente com dinheiro público ou exclusivamente com dinheiro privado ou ainda com um sistema intermediário entre ambos. Os argumentos contra e a favor são muitos, e difícil é saber qual deles tem mais peso que os outros.

Os defensores do financiamento público argumentam, principalmente, que esse sistema evitaria ou, pelo menos, diminuiria a influência dos interesses particulares no trato da coisa pública. Outro argumento muito forte é que seu propósito é alcançar a chamada paridade de armas, ou seja, o financiamento público garantiria a tão almejada igualdade entre os candidatos, assim como garantiria que todos tivessem os mesmos recursos financeiros para que pudessem ter as mesmas chances na disputa eleitoral. Então, o financiamento público das campanhas teria o condão de desfazer a relação entre eleição e maiores ou menores recursos financeiros.

Com o financiamento público, os partidos políticos e os mandatários, depois de eleitos, não ficariam reféns de empresas ou grupos privados (independentemente destes agirem dentro da legalidade ou não). E há, ainda, o argumento de que, com o financiamento público, as operações financeiras dos partidos e candidatos seriam mais transparentes e sujeitas aos órgãos de controle.

São essas as razões pelas quais alguns acreditam que o financiamento exclusivamente público para as campanhas eliminaria ou reduziria a corrupção.

De outro lado, temos os opositores do financiamento público, que defendem que o sistema de financiamento exclusivamente privado forçará os partidos a reverem sua política interna e isso resultará em um fortalecimento e enraizamento dos partidos na sociedade. Isso porque, para receber recursos diretamente dos cidadãos ou de empresas, o partido deverá realizar atividades, angariar simpatizantes e consequentemente novos filiados.

Mas o argumento mais forte em defesa do financiamento privado é simples: vivemos em uma democracia. Então, se o cidadão quer doar para o seu candidato, por que não poderia? Não vamos entrar no mérito da origem desse dinheiro, do destino etc. Pensemos na hipótese de o cidadão comum, cumpridor de seus deveres, querer participar da vida política, auxiliando seu candidato por acreditar que ele é um bom cidadão e será um bom administrador/representante para seu povo e sua cidade. Aliado a isso, o financiamento privado é um meio que induz os eleitores a terem um maior controle sobre a atuação dos políticos eleitos, ou seja, o mandatário, se eleito, terá muito mais motivos para prestar contas aos seus eleitores, e estes terão muito mais animus para cobrar. Portanto, não há nada de errado ou antidemocrático no financiamento privado; muito pelo contrário.

Na verdade, ambos os sistemas têm pontos negativos e positivos e devem ser sopesados ante a realidade brasileira.

No âmago dessa controvérsia, o que está faltando é uma discussão anterior sobre o papel dos partidos políticos no Brasil. Os partidos são considerados pessoas jurídicas de direito privado que exercem uma atividade que é de interesse público. Suas funções primordiais são: assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal2.

Os partidos desempenham um papel de excelência na manutenção do sistema democrático representativo e por isso convencionou-se que o Estado deve assegurar os meios de sua manutenção e de seu fortalecimento. Contudo, a celeuma em torno das discussões sobre qual o tipo de financiamento deve ser adotado para os partidos é reflexo da imagem ruim que a política e os políticos têm perante a sociedade.

Somente para ilustrar, citamos o índice de aprovação conseguido pelo Congresso Nacional (19%) e pelos partidos políticos (7%), os lanterninhas do último Índice de confiança na Justiça (ICJBrasil), elaborado pela Fundação Getúlio Vargas, no início do ano. O objetivo dessa pesquisa é medir o sentimento dos brasileiros em relação a suas instituições, ou seja, se os cidadãos comuns acreditam que elas sejam capazes de cumprir suas funções de modo satisfatório, se são importantes em sua vida e se seus benefícios justificam seus custos3.

É certo que o financiamento dos partidos e das campanhas não é uma atividade corrupta em sua essência, porém, a história da política brasileira mostra que esses temas estão sempre vinculados.

A corrupção política e eleitoral se manifesta sob diversas modalidades que vão desde a compra de votos e o uso de recursos ilegais até a negociação de cargos e o abuso dos recursos públicos. As condutas mais comuns vinculando o financiamento e a corrupção são as seguintes:

•    Recebimento de contribuição de origem proibida;
•    Recebimento de dinheiro oriundo de atividades ilegais;
•    Uso indevido de recursos públicos (desvio de serviços, servidores públicos etc.);
•    Utilização de dinheiro para a “compra de votos”.

Por todas essas razões, a proposta que parece ser mais ponderada é a do meio, ou seja, o sistema que mescla o financiamento público, sem proibição da contribuição privada, mas com forte fiscalização em cima das duas.

Aí subsiste outro grande problema: a dificuldade de fiscalizar o uso dos recursos, independentemente da origem. Então, qualquer que seja o sistema adotado, a estrutura dos órgãos de controle terá que ser ampliada, sob pena de a fiscalização ser incapaz de produzir o efeito pretendido.

Além disso, talvez, mais importante que um órgão de controle forte e bem estruturado seja aprimorar a legislação sobre a fiscalização, porque não basta uma regulamentação moderna sobre a forma de distribuição de fundos; é preciso que também sejam estabelecidas obrigações e sanções para o descumprimento das normas, porque norma sem sanção é norma feita para ser descumprida.



1
Servidora da Justiça Eleitoral lotada na Escola Judiciária Eleitoral do TSE.

2 A Lei nº 9.096/1995 traça, em seu artigo 1º, as funções dos partidos políticos no Brasil:
Art. 1º O partido político, pessoa jurídica de direito privado, destina-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal.

3 Confiança nas instituições. Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,confianca-nas-instituicoes-,979683,0.htm>. Acesso em: 29 maio 2013.