Entrevista
Nesta terceira edição do ano IV da Revista Eletrônica EJE,aentrevista é com o Dr. Márlon Jacinto Reis, juiz de direito e professor de Direito Eleitoral.
Considerando que em 2014 teremos eleições para presidente da República, governadores de estado, senadores, deputados federais e também deputados estaduais ou distritais, gostaria de falar um pouco sobre os trabalhos no dia do pleito. Qual é o papel da mesa receptora? Quem participa dessa mesa?
A mesa receptora tem um importante papel e, por isso, a participação é reservada para brasileiros idôneos. São vários critérios estabelecidos na lei. A finalidade é justamente receber o eleitor, identificá-lo e permitir que ele exerça, com o devido sigilo, com toda a segurança, o seu direito constitucional ao voto. A mesa é composta por um presidente, um primeiro mesário, um segundo mesário, dois secretários e um suplente, totalizando seis cidadãos à disposição da Justiça Eleitoral para cumprir esse importante trabalho.
O senhor poderia explicar um pouco mais sobre o trabalho do mesário? É possível que qualquer pessoa atue como mesário no dia da eleição?
O mesário, por exercer justamente uma missão tão importante quanto à de tornar viável o exercício do voto, tem uma série de missões. Entre os membros da mesa, há uma divisão de trabalho. O principal responsável pela condução dos trabalhos naquela mesa é o seu presidente, que tem poder de adotar providências para proteger os trabalhos eleitorais, inclusive, requisitando a força pública, o trabalho da polícia, se necessário. Além disso, todos os demais membros da mesa têm atribuições. Um deles vai ficar na fila, atendendo o eleitor, tirando dúvida e orientando-o a ingressar na seção eleitoral, outros identificarão o eleitor, confirmando que se trata realmente da pessoa autorizada a votar, até que o eleitor chegue à cabine indevassável, onde poderá exercer, com todo o sigilo exigido pela Constituição, o seu direito ao voto.
No que se refere ao trabalho de fiscalização no dia da eleição, quem pode realizá-lo?
Existem muitos fiscais na eleição. O primeiro deles é o Ministério Público, que tem a missão constitucional de velar pela ordem democrática, o que implica ver asseguradas as garantias eleitorais, as garantias concedidas aos eleitores, mas também aos partidos e aos candidatos, durante as eleições. Mas a lei outorga aos próprios partidos um poder fiscalizatório muito grande, tanto que permite que eles nomeiem dois fiscais para atuar em cada mesa receptora de votos. Então, pode-se ver que os partidos também são chamados a exercer essa responsabilidade, indicando à Justiça Eleitoral eventuais falhas, ilícitos e até crimes que possam eventualmente acontecer.
Qual é o horário definido para a eleição? E quem tem preferência na hora do voto?
O horário é das 8h da manhã até as 17h. Durante esse período, o eleitor é chamado a comparecer para votar, inclusive se ele chegar até as 17h, enquanto não se encerrou a votação. Se chegar até o último segundo antes das 17h, ele participará do processo, mesmo que haja fila. Nesse caso, ele receberá uma senha, permanecerá na fila até ser chamado a adentrar no recinto e votar. A senha será distribuída para evitar que pessoas que cheguem após as 17h também exerçam esse mesmo direito, já que é preciso dar uma organização às eleições. E a mesa, especialmente o seu presidente, recebe no seu treinamento orientações específicas sobre quem deve ser autorizado a votar com prioridade, com primazia. São duas ordens de pessoas que podem votar com prioridade: aqueles funcionários e os que estão agindo a serviço da Justiça Eleitoral, e aqueles que são portadores de algum tipo de debilidade, que a lei sabiamente reconhece que devem passar à frente dos demais para evitar qualquer tipo de sofrimento desnecessário ao votar. Juízes, promotores eleitorais, agentes de polícia, servidores da Justiça Eleitoral, o que inclui os eventuais, como, por exemplo, os próprios mesários, e também aqueles que precisam por razões físicas – pessoas idosas, portadoras de necessidades especiais, mulheres em estado de gravidez, ou em fase de amamentação – são exemplos de pessoas que serão automaticamente admitidas a votar com prioridade. Eu recomendo que aqueles que são detentores do direito legal à prioridade procurem o presidente da mesa e aleguem o seu direito e eles serão prontamente atendidos.
Se o eleitor não estiver no domicílio eleitoral no dia da eleição, ele vai ter que justificar a abstenção?
Sim. É muito importante que aquele que está longe do seu local de votação apresente o requerimento de justificativa eleitoral. E é fácil, é simples fazê-lo. Ele deve procurar qualquer cartório eleitoral para obter esse requerimento, ele pode também imprimi-lo na Internet. Nos sites do TSE e dos tribunais regionais eleitorais, há formulários disponíveis para impressão. E também ele pode obter esse requerimento até mesmo junto às seções ou mesas eleitorais, nos locais de votação espalhados por todo o país. Em todos eles, em regra, há requerimentos disponíveis para preenchimento pelos que pretendem justificar o voto. Ele deve fazer isso comparecendo com esse requerimento preenchido, com seu título de eleitor e com o documento oficial de identidade para se apresentar ao presidente da mesa, ou quem o substitua eventualmente, e requerer o direito a apresentar a sua justificativa eleitoral, e será prontamente atendido, e a justificativa será feita imediatamente.
E se ele não votar nem justificar a abstenção, quais são as consequências para esse eleitor?
Desde logo é preciso dizer que a lei outorga um prazo especial para aquele que não justificou, fazê-lo posteriormente, desde que observe o prazo de 60 dias. Então, se alguém não justificou a sua abstenção, a sua ausência eleitoral, deve fazê-lo em 60 dias. Para justificar a ausência no prazo normal, no dia da votação, não é preciso apresentar nenhuma prova, nenhum documento, como passagem, por exemplo, para demonstrar que estava fora. Mas nesses 60 dias, para fazer o requerimento, o eleitor vai precisar juntar prova de uma passagem aérea, ou terrestre, ou qualquer outro documento idôneo a demonstrar que, de fato, não estava na cidade no dia da votação, não estava nas proximidades do seu local de votação. Se não votar, nem justificar, ele terá que pagar uma multa. É recomendável que o eleitor efetue o pagamento dessa multa o quanto antes para evitar que haja outras consequências negativas do não pagamento.
Quais são as consequências para o eleitor que não está em situação regular com a Justiça Eleitoral?
É bom lembrar que, no nosso país, se adota o voto obrigatório, por isso há consequências negativas – são várias e bastante severas – para aqueles que não comparecem nem justificam, aqueles que estão em débito com a Justiça Eleitoral. Em primeiro lugar, ficam impedidos de celebrar contratos públicos, ficam impedidos de participar de qualquer tipo de concorrência pública, ficam impedidos de participar de concursos, por exemplo, para ingressar no serviço público como servidores, ficam proibidos de efetuar matrícula em instituições oficiais de ensino e até de obter o passaporte. É amplo o leque das consequências negativas que podem sobrevir para aquele que não exerceu devidamente seu direito de voto nem justificou. Por isso, repito, é muito recomendável que aquele que está com alguma pendência compareça. Perceberá que o valor não é elevado, é um valor módico e é para lembrá-lo do seu dever de votar. E ele, com certeza, poderá efetuar rapidamente o pagamento. Também faço questão de mencionar que a lei autoriza o juiz eleitoral a perdoar a multa em caso de pessoas que comprovem muita dificuldade econômica. Pessoas em estado de pobreza podem alegar e obter, até mesmo do juiz eleitoral, o perdão dessa multa.
O senhor poderia explicar a diferença entre o voto em branco e o voto nulo? É verdade que esses votos são capazes de anular uma eleição?
O voto nulo é caracterizado pelo desejo do eleitor de repelir a mensagem política passada a ele por todos os partidos e candidatos. Com isso, ele quer dizer que adota uma postura contrária a tudo, repelindo esse universo político que está representado ali pelas opções contidas na urna. Já o voto em branco significa que o eleitor não quer adotar nenhuma posição, nem de assumir uma postura, votando efetivamente em alguém, nem de repelir todo esse modelo, anulando o voto. Ele quer simplesmente comparecer e pronto. “Compareci, mas não me posiciono, nem positiva, nem negativamente”. Ambos têm a característica de transferir para aqueles que votaram a palavra final sobre a decisão. Nem o voto nulo, nem o voto em branco anulam as eleições. Não importa em que quantidade eles aconteçam. Porque a eleição, para sua validade, precisa que tenha apenas algum comparecimento. E o resultado será descoberto pela aplicação de normas que levam em conta apenas os votos válidos, só os votos válidos. Eu já vi, e todos devem ter visto pela Internet, algumas correntes afirmando que, se todos votassem ou se, pelo menos, mais de 50% dos eleitores votassem nulo, as eleições seriam anuladas, mas essa informação não corresponde à verdade, porque só são contabilizados, para o resultado do pleito, os votos válidos. Então, votar nulo e votar em branco não é politicamente recomendável, é mais correto que o eleitor se esforce para encontrar um candidato da sua confiança porque senão estará delegando a quem votar em candidatos a palavra final sobre os eleitos, e ele não poderá participar. A lei só prevê a renovação das eleições em caso de anulação determinada pela Justiça Eleitoral em virtude de ilícitos observados durante as eleições, como é o caso, por exemplo, de práticas como abuso de poder econômico ou político, ou captação ilícita de sufrágios, compra de votos na linguagem popular. Nesses casos, havendo anulação por ordem da Justiça Eleitoral, e se houver mais de 50% dos votos anulados, aí, sim, haverá nova eleição. Mas só nessas hipóteses. No caso do voto nulo, repito, não há anulação total do processo eleitoral, só houve anulação daquele voto.
*Entrevista gravada e produzida pela Assessoria de Imprensa e Comunicação Social do TSE.
Assista, na galeria ao lado, ao vídeo da entrevista.