Instituições e partidos apresentam sugestões sobre propaganda eleitoral
Última audiência pública sobre regras das Eleições 2024 abordou uso de inteligência artificial e impulsionamento de conteúdo, entre outros temas
Nesta quinta-feira (25), terceiro e último dia do Ciclo de Audiências sobre as regras das Eleições Municipais de 2024, 17 entidades, dois partidos políticos, e 12 cidadãs e cidadãos apresentaram uma série de propostas com foco na minuta de resolução sobre propaganda eleitoral. A vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, relatora das resoluções do pleito, presidiu o encontro.
As sugestões abrangeram as normas sobre o uso da inteligência artificial (IA) nas eleições, impulsionamento de conteúdo pela internet, uso de dados pessoais, utilização de jingles e paródias nas campanhas eleitorais e a regulamentação das lives eleitorais. A responsabilidade pela publicação de materiais fabricados, manipulados ou desinformativos também foi debatida no encontro.
Na abertura, a ministra Cármen Lúcia reiterou que todas as quase 1000 sugestões recebidas sobre as minutas de resoluções serão devidamente avaliadas e respondidas. As propostas foram encaminhadas por entidades, partidos políticos e sociedade em geral, por meio de formulário digital entre os dias 4 e 19 de janeiro, para o aperfeiçoamento das regras das eleições deste ano. Em seguida, os textos finais das resoluções serão analisados e aprovados pelo Plenário do TSE.
“O uso da palavra foi objeto de mais de 150 pleitos, que foram deferidos segundo critérios previamente estabelecidos. Os que foram deferidos constituem amostragem das aproximadamente 950 contribuições oferecidas”, disse a ministra, ao agradecer as contribuições enviadas ao Tribunal.
Acesse a minuta da propaganda eleitoral
Confira as propostas das instituições e partidos por assunto:
Uso da inteligência artificial nas eleições e responsabilidade pela publicação
Representado por Alana Roriz Rizzo Lobo, o YouTube reconheceu a importância de medidas de combate à desinformação e destacou que, para coibir a prática, a plataforma de vídeos já proíbe a veiculação de conteúdos tecnicamente manipulados que enganam os usuários, inclusive, em anúncios. O YouTube reforçou a tese de inclusão de um novo parágrafo ao artigo 9º-B com a intenção de especificar que a responsabilidade pela identificação de conteúdo fabricado ou manipulado é da pessoa responsável pela sua elaboração.
Já a Associação Lawgorithm de Pesquisa em Inteligência Artifical, pela qual falou Juliano Souza de Albuquerque Maranhão, elogiou a regra prevista no artigo 9º-B. Segundo a entidade, o dispositivo foca na regulação do comportamento de candidaturas e partidos e “circunscreve a preocupação com as chamadas deepfakes”. A instituição também acredita que é necessário explicitar que a responsabilidade pelo conteúdo é da candidata, do candidato ou da pessoa que o produziu.
O Google Brasil, representado por Tais Cristina Tesser, enfatizou que as informações e os conteúdos relativos aos anúncios são de responsabilidade dos próprios anunciantes. A plataforma pediu ajustes nos parágrafos 11 e 12 do artigo 29 de modo a reforçar que o desligamento da propaganda caiba aos anunciantes e, sobretudo, ressaltar a responsabilidade deles de não impulsionar conteúdos que veiculem fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados.
Em sua manifestação na audiência, o Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político (Camp) sugeriu a proibição das deepfakes como principal contribuição. “Não podemos dar margem ou autorizar — mesmo com advertência — algo que tenha ‘fake’ no nome”, disse Bruno Hoffman, que falou pela entidade. Segundo o Camp, a inteligência artificial pode ser produtiva, mas é fundamental “focar no impedimento dos usos negativos”.
A responsabilização dos autores das publicações também foi abordada pelo Instituto de Referência em Internet e Sociedade (Iris), representado por Paloma Rocillo Rolim do Carmo. De acordo com a instituição, é preciso explicitar de quem é a responsabilidade de identificar um material como de caráter político-eleitoral e de informar ao cidadão que determinado conteúdo foi fabricado com uso de tecnologia. O advogado e professor de Direito Eleitoral Diogo Rais propôs que, na minuta, fosse indicada a responsabilidade do usuário de divulgar qual tipo de tecnologia foi utilizada para produzir o conteúdo, já que há uma dificuldade de avaliação tecnológica por si só.
Representado por sua presidente, Francieli de Campos, o Instituto Gaúcho de Direito Eleitoral apresentou duas sugestões de regulamentação da inteligência artificial na propaganda eleitoral. A primeira delas visa incluir o conceito de IA no artigo 37 da resolução. “Entendemos que para fins de segurança jurídica, é fundamental essa inclusão na legislação eleitoral porque nós não temos no Brasil uma definição do que é considerado inteligência artificial”, propôs. O instituto também sugeriu a reformulação do artigo 9-B para deixar mais claro o que é lícito e o que é ilícito com a utilização desse tipo de recurso tecnológico.
Desinformação, impulsionamento de conteúdo e lives eleitorais
O Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), representado pelo advogado Miguel Filipi Pimentel Neves, encaminhou proposta para a inclusão de um parágrafo no artigo 9º-B para tornar lícito o uso de propaganda eleitoral, sobretudo na modalidade de impulsionamento, para melhor informar a população e desmentir de maneira mais rápida os conteúdos falsos que estejam em circulação na internet. O PT sugeriu, ainda, uma mudança no artigo 29-A para permitir que as lives eleitorais sejam usadas na pré-campanha.
Já o Facebook Brasil, pelo qual falou Rodrigo Ruf Martins, trouxe a perspectiva da Meta, responsável pelas plataformas Facebook, Instagram e WhatsApp. A rede social apresentou quatro proposições. A primeira delas foi incluir dispositivo no artigo 8º da minuta para, nos casos de propaganda eleitoral que veicule desinformação, deixar clara a necessidade de mencionar o precedente do TSE que embasar a decisão judicial que determinar a remoção de conteúdos repetitivos ou idênticos. A segunda proposta diz respeito à obrigatoriedade de referência, no artigo 38, da indicação de URL para a retirada desses conteúdos. A empresa sugeriu, ainda, um ajuste para esclarecer, no parágrafo do artigo 9º-B, que a notificação se trata de uma ordem judicial.
A terceira proposta foi um ajuste ao artigo 9º-C, com a substituição do termo “responsabilidade” por “dever”. Por fim, o Facebook Brasil propôs a alteração da redação de item do artigo 29 para reforçar o dever da candidatura contratante de observar o período de bloqueio do impulsionamento.
Sobre as mídias em que são gravadas as propagandas, a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) – representada por Rodolfo Salema – explicou que a atual redação prevê a possibilidade da entrega física ou eletrônica do material, sendo a física tida como regra. Contudo, a entidade ponderou que, atualmente, a remessa eletrônica se tornou a principal forma de envio do material. Quanto às lives eleitorais, a Abert solicitou a retirada da parte final do inciso III do artigo 3º para permitir a reprodução das lives da transmissão em veículos jornalísticos.
Também sobre impulsionamento, o Google apresentou proposta de exclusão do inciso II do parágrafo 7º-B do artigo 28. Para a big tech, a existência de anúncios impulsionados com palavras-chave de adversários não causa confusão ou desvio do eleitor, porque não afetaria resultados orgânicos ou postados.
Já a Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), pela qual falou Bruno Cezar de Souza, sugeriu a adoção, no artigo 3º-B, de um marco temporal para o uso de impulsionamento nas campanhas. Já no artigo 9º-B, na visão da entidade, deveria ser incluído um parágrafo para tratar da exigência da autorização expressa das pessoas apresentadas como apoiadoras de determinada candidatura. “Para que não haja, como houve em eleições pretéritas, uso de apoiador sem que ele tenha dado autorização para o uso de seu nome e imagem nas campanhas eleitorais”, justificou o representante da Abradep.
Conduta de influenciadores digitais no período eleitoral
O Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), pelo qual se expressou Gustavo Guilherme Bezerra, pediu a inserção de um dispositivo no artigo 43 ou um parágrafo no artigo 43-A para fixar o dia 30 de junho como a data-limite de afastamento dos influenciadores digitais, que também forem pré-candidatos, dos respectivos canais. A legenda ainda recomendou que, a partir de agosto, os criadores de conteúdo que não se candidatarem a cargos eletivos também ficassem restritos a não fazer críticas ou elogios em seus programas, postagens ou publicações.
Jingles e paródias de campanhas eleitorais
Ao participar como cidadã, a cantora Marisa Monte manifestou a preocupação da classe artística com o uso de obras musicais em paródias ou jingles utilizados por candidaturas e partidos. Para ela, deveria ser direito da autora ou do autor impedir que sua criação seja usada com essa finalidade para não ter a imagem compulsoriamente associada a determinado candidato ou ideologia.
Já a presidente da Associação Procure Saber, Paula Lavigne, que também integra a classe artística, perguntou como artistas devem se comportar no período eleitoral, se podem declarar o voto e quais são os requisitos a serem obedecidos durante a realização de eventos.
Dados pessoais do eleitorado
A Autoridade Nacional de Proteção de Dados, representada na audiência por Miriam Wimmer, pontuou que, em processos eleitorais, é normal que candidatas e candidatos busquem compreender preferências e interesses do eleitorado. Contudo, alertou que a possibilidade assumiu novos contornos diante das evoluções tecnológicas, que permitem formação de um perfil bastante detalhado de indivíduos a partir da análise e tratamento de dados.
Demais participantes
Também participaram da audiência pública a Associação Data Privacy Brasil de Pesquisa; a Associação Internetlab de Pesquisa em Direito e Tecnologia; a Aláfia Lab; a Associação Artigo 19 Brasil; o Instituto Cidadania Digital (Conselho Digital); e o Instituto Vero. André Gualtieri de Oliveira, Beatriz de Araújo Haikal Leite, Débora Gomes Salles, Fabiano Lago Garrido, Ingrid Neves Reale, Filipe José Medon Affonso, Lígia Vieira de Sá e Lopes, Luiz Eugenio Scarpino Junior e Samara Mariana de Castro manifestaram-se como cidadãs e cidadãos.
Última audiência
A audiência desta quinta-feira tratou também das minutas de resolução sobre representações, reclamações e pedidos de direito de resposta; e ilícitos eleitorais. As audiências públicas, realizadas nos dias 23 de janeiro, 24 de janeiro e 25 de janeiro, podem ser acessadas pelo canal do TSE no YouTube.
Composição da mesa
Além da ministra Cármen Lúcia, participaram da mesa de trabalho do último dia de audiências o ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) e ex-presidente do TSE, Ayres Britto, os ministros do TSE André Ramos Tavares, Isabel Gallotti e Edilene Lôbo, o secretário-geral da Presidência do TSE, José Levi Amaral, o diretor-geral da Secretaria da Corte, Rogério Galloro, o juiz auxiliar da Vice-Presidência, Júlio Andrade, e a assessora da Vice-Presidência do TSE, Roberta Gresta.
Recorde de sugestões
O total de propostas encaminhadas pela sociedade para colaborar com o aprimoramento das resoluções sobre as Eleições de 2024 foi recorde. Ultrapassou os números verificados nos processos eleitorais anteriores. Ao todo, o TSE recebeu 945 contribuições.
Acesse as minutas das resoluções de 2024.
BA/EM, DM
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