Eleições 2022: confira os principais pontos do relatório das Aijes julgadas nesta terça
Ações apontam supostas irregularidades cometidas na campanha à reeleição à Presidência da República no pleito do ano passado
O corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Benedito Gonçalves, apresentou, na sessão desta terça-feira (10), o relatório referente a três Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aijes) contra o ex-presidente da República e então candidato à reeleição nas Eleições 2022, Jair Bolsonaro, e seu candidato a vice na chapa Walter Souza Braga Netto. O ministro detalhou as acusações, os argumentos da defesa, as alegações finais apresentadas pelas partes ao longo do andamento do processo, o parecer da Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE), as diligências determinadas e os despachos proferidos ao longo dos processos.
As ações pedem a inelegibilidade de Bolsonaro e de seu candidato a vice, Braga Netto, por abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação decorrentes da utilização das dependências do Palácio da Alvorada (residência oficial do presidente da República) e do Palácio do Planalto (sede do governo federal) para a realização de supostos atos ilegais de campanha. Na prática, as ações alegam supostas violações aos incisos I e II do artigo 73 da Lei nº 9.504/1997, que proíbem ceder ou usar bens da União em benefício de candidato e utilizar, para tal finalidade, materiais ou serviços custeados pelo governo.
Agora, o Plenário vai julgar se houve abuso de poder político pelo desvio de finalidade no uso de bens públicos em benefício da candidatura e se houve gravidade bastante para comprometer a legitimidade da disputa. Portanto, o julgamento abrange:
- analisar a premissa do abuso;
- definir se o uso dos bens públicos foi ilegal;
- e, em caso de resposta positiva, delimitar a gravidade da conduta, do ponto de vista qualitativo e quantitativo.
Ações
Na primeira Aije (0600828-69), o Partido Democrático Trabalhista (PDT) aponta suposto desvio de finalidade de bem público praticado por Jair Bolsonaro em proveito das candidaturas em lives tradicionalmente realizadas às quintas-feiras nas dependências do Palácio do Planalto para divulgar atos de governo. O PDT alega que tais transmissões ao vivo utilizavam o aparato e o mobiliário do prédio público, inclusive com intérprete de Libras custeado pelo erário.
Nessa ação, o partido aponta irregularidades na live do dia 18 de agosto de 2022, quando Bolsonaro pediu votos para si e para 17 aliados políticos de maneira explícita, chegando a mostrar o “santinho” de cada um deles e a declarar a expressão de "horário eleitoral gratuito". Na data do ajuizamento da Aije, a transmissão contava com 346 mil visualizações.
A principal linha de defesa de Bolsonaro é que todos os candidatos tinham a possibilidade de realizar propaganda eleitoral pela internet, com a veiculação de lives ou por qualquer outro meio, tratando-se de ferramenta democrática e de custos reduzidos, não havendo quebra da isonomia ou violação à paridade de armas.
Portanto, segundo a defesa, “qualquer dos candidatos pode realizar suas próprias transmissões ao vivo, por meio de suas redes sociais, e declarar apoio via internet a qualquer correligionário que pretendam, sem que a isso seja atribuída vantagem indevida”.
A defesa também afirma ser impossível concluir que a referida live foi realizada no Palácio do Planalto, já que a gravação ocorreu em frente a uma parede branca, sem a presença de qualquer dos símbolos da República (bandeira nacional, brasão ou selo), biblioteca, fotografias ou qualquer meio de identificação do local que pudesse, eventualmente, ensejar algum ganho competitivo ao candidato.
Alvorada
Também apresentada pelo PDT, a outra ação (0601212-32) pede a inelegibilidade pela exibição de material de campanha e pedido de votos durante a transmissão de lives pelo YouTube realizadas dentro da biblioteca do Palácio da Alvorada, utilizando aparato estatal, inclusive custeado com dinheiro público.
Nesse caso, o partido alega irregularidade, especificamente, na transmissão realizada no dia 21 de setembro de 2022, quando Bolsonaro anunciou que passaria a fazer transmissões diárias, com o objetivo de divulgar candidaturas e fortalecer a bancada parlamentar. Para a agremiação, o desvirtuamento da live transmitida para pedir votos implica utilizar estrutura da Administração Pública para finalidades eleitorais, configurando abuso do poder político, na medida em que viola o princípio da isonomia, bem como compromete a legitimidade e a normalidade do pleito.
A defesa de Bolsonaro sustenta que o Palácio da Alvorada é a residência oficial do presidente da República. Assim, a transmissão da live nas dependências do palácio poderia ser equiparada a uma transmissão na residência habitual de qualquer outro candidato. Também assegura que não foram utilizados bens ou serviços públicos para a produção e a divulgação da live.
Além disso, para a defesa, o fato de o Palácio da Alvorada ser a casa do então presidente Jair Bolsonaro atrai a proteção constitucional à inviolabilidade e à vida privada de seus moradores, que estão autorizados a, dentro de qualquer dos seus cômodos, exercer seus direitos fundamentais, inclusive os políticos, tendo ainda a garantia à livre manifestação do pensamento, sem qualquer restrição.
Governadores e artistas
A terceira Aije (0601665-27) foi ajuizada pela coligação Brasil da Esperança (PT/PV/PCdoB) e pela Federação PSOL-Rede (PSOL/Rede/PSB/SD/Avante/Agir/Pros) por abuso do poder político pelo fato de Bolsonaro conceder entrevista coletiva nas dependências do Palácio do Planalto para noticiar seus novos aliados políticos. As entrevistas ocorreram nos dias 3 e 6 de outubro de 2022, após a realização do primeiro turno das Eleições 2022, quando Bolsonaro anunciou o apoio recebido dos governadores do Acre, Amazonas, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Rondônia e Roraima.
A ação ainda aponta que o então candidato recebeu no Palácio da Alvorada diversos artistas sertanejos para realizar propaganda em favor de sua campanha, desvirtuando a finalidade do bem público e configurando abuso pela “utilização da estrutura da Administração Pública do Governo Federal para angariar apoios e satisfazer finalidades eleitoreiras”.
Quanto a esse caso, a defesa sustenta que as manifestações das personalidades que visitaram e emprestaram apoio político ao candidato se deram no exercício do direito à liberdade de expressão, de forma “singela e espontânea”, inexistindo “qualquer benefício no fato de o investigado ter recebido apoios políticos naturais e orgânicos em seus ambientes de trabalho e de residência”.
A defesa ainda sustenta que a recepção aos governadores ocorreu na parte externa do Palácio do Planalto, voltada para a rua e de livre circulação, o que poderia ocorrer na frente de qualquer residência ou local de trabalho. Não há presença de símbolos da República ou outros meios que pudessem ensejar algum ganho competitivo aos candidatos.
Parecer da PGE
Conforme o relatório do ministro Benedito Gonçalves, a Procuradoria-Geral Eleitoral opina pela improcedência dos pedidos nas ações, em razão da ausência de gravidade nas condutas, reconhecendo, todavia, a prática de conduta vedada, por infração ao artigo 73, inciso I, parágrafo 2º da Lei nº 9.504/1997.
Confira a íntegra do relatório do corregedor-geral Eleitoral.
MC/LC, DM
Processos relacionados: Aije 0600828-69.2022.6.00.0000, Aije 0601212-32.2022.6.00.0000 e Aije 0601665-27.2022.6.00.0000