Acusação e defesa apresentam alegações em Aijes sobre supostas irregularidades nas Eleições 2022
Advogados das partes autoras e de Jair Bolsonaro e Braga Netto fizeram sustentações orais após a leitura do relatório pelo ministro Benedito Gonçalves
O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) começou a julgar, nesta terça-feira (10), três Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aijes) contra o ex-presidente da República e então candidato à reeleição nas Eleições 2022, Jair Bolsonaro, e seu candidato a vice na chapa, Walter Souza Braga Netto. Após a leitura do relatório pelo corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Benedito Gonçalves, os advogados de acusação e de defesa apresentaram as respectivas alegações.
As Aijes 0600828-69, 0601212-32 e 0601665-27 pedem a inelegibilidade de Bolsonaro e de Braga Netto por abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação decorrentes da utilização das dependências do Palácio da Alvorada (residência oficial do presidente da República) e do Palácio do Planalto (sede do governo federal) para a realização de supostos atos ilegais de campanha.
Confira os argumentos da acusação e da defesa.
Aije 0600828-69
- Argumentos da acusação
O advogado Walber Agra e a advogada Ezikelly Silva Barros, representando o Partido Democrático Trabalhista (PDT), autor de duas ações (0600828-69, 0601212-32), tiveram 30 minutos para apresentar seus argumentos. Segundo eles, houve desvio de finalidade nas lives realizadas por Bolsonaro no curso do mandato. Durante as sustentações orais, eles defenderam que as transmissões, que tinham a finalidade de propagar atos de governo, tornaram-se, na prática, verdadeiros comícios virtuais, com o uso de bens e serviços públicos, inclusive intérprete de Libras custeado pelo erário, para a gravação e a propagação dos conteúdos nas redes sociais.
Especificamente sobre a Aije 0600828-69, a acusação alegou que, embora as lives do então presidente Jair Bolsonaro tenham tido a finalidade de propagar os atos do governo federal, em 18 de agosto de 2022, o então candidato à reeleição utilizou-se da transmissão para pedir votos de maneira explícita para si e para 17 aliados políticos, chegando a mostrar o “santinho” de cada um deles. Com duração de quase uma hora, o evento foi publicado nas redes sociais de Bolsonaro, que possui aproximadamente 3,8 milhões de seguidores, e contou com mais de 346 mil visualizações no YouTube e no Facebook.
A atitude, segundo os advogados, caracteriza conduta vedada, uma vez que desequilibrou o pleito e afetou a normalidade e a igualdade de oportunidades entre aqueles que disputaram as Eleições 2020. Assim, quanto a essa primeira Aije, a acusação apontou haver hipótese clara de desvirtuamento de poder, caracterizando o abuso. De acordo com o artigo 37, parágrafo 1º, da Constituição Federal, “a publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”.
- Alegações da defesa
O advogado de Jair Bolsonaro e Braga Netto, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, apresentou os respectivos argumentos em 30 minutos. Ao defender a improcedência das ações, ele afirmou que a abrupta fusão de processos classificados por ele como “desiguais” compromete o contraditório e gera desequilíbrio entre as partes. Assim, solicitou que o julgamento das Aijes seja separado, para análise individualizada. Conforme o advogado, na ambiência de ações genéricas como as Aijes, o bem jurídico tutelado não é a isonomia entre os candidatos; é a normalidade e a legitimidade das eleições. Assim, “para justificar a adoção da gravíssima pena de inelegibilidade, o abuso do poder político precisa ser grave”.
Quanto à Aije 0600828-69, entre outros pontos, o advogado alegou que, com base no material analisado, não se pode concluir o lugar exato em que a live foi realizada, uma vez que a gravação ocorreu em frente a uma parede branca, apoiando-se os materiais em uma mesa preta, e o investigado sentado numa cadeira gamer, havendo simples presunção de que se tratava do Palácio do Planalto. Segundo ele, não há a presença de nenhum dos símbolos da República (bandeira nacional, brasão ou selo), biblioteca, fotografias ou qualquer meio de identificação do local que pudesse, eventualmente, ensejar algum ganho competitivo ao candidato, assim como não é possível conseguir demonstrar o mau uso de bens públicos.
Também conforme a defesa, a live foi transmitida nas redes privadas do candidato, não constando em redes oficiais do Palácio do Planalto. Alegou ainda que Bolsonaro, muito antes de ser eleito presidente da República, sempre fez uso de lives – o que denominou como “ferramenta absolutamente democrática”, de baixíssimo custo e acessível à população em geral e a qualquer candidato.
Aije 0601212-32
- Argumentos da acusação
Já na Aije 0601212-32, também proposta pelo PDT, os então candidatos à Presidência e à Vice-Presidência são acusados de praticar abuso de poder político e conduta vedada a agente público em campanha eleitoral durante live feita no Palácio da Alvorada em 21 de setembro de 2022, quando Jair Bolsonaro ainda ocupava o cargo de presidente.
Na ocasião, de acordo com o PDT, além de pedir votos para si e para aliados, ele exaltou motociatas e comícios realizados em Pernambuco, citou pontos fortes de sua campanha eleitoral e ainda anunciou a participação do então deputado federal e candidato ao Governo de Goiás Major Victor Hugo (PL), que conclamou a população de Goiânia (GO) a participar de uma carreata marcada para acontecer em 24 de setembro do ano passado.
- Alegações da defesa
O advogado dos investigados, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, rotulou a conduta apontada pelo PDT nas ações como frágil e inapta a configurar abuso do poder político e destacou que as situações hoje examinadas pelo TSE, “se fossem verdadeiras, implicariam, no máximo, a aplicação de multa”, que não foi requerida nas petições iniciais pelas partes autoras.
Ainda segundo o advogado, a live foi transmitida em redes sociais privadas, sem exposição de símbolos da República e com o uso de objetos pessoais do então presidente. Para Carvalho Neto, como todas as candidaturas tinham a possibilidade de realizar propaganda eleitoral na internet, não houve quebra da isonomia nem violação à paridade de armas entre os concorrentes.
Aije 0601665-2
- Argumentos da acusação
O advogado Angelo Longo Ferraro, representando a coligação Brasil da Esperança e a Federação PSOL-Rede, autoras da Aije 0601665-27, teve 15 minutos para fazer sua sustentação oral. A ação indica que o anúncio de apoios angariados de governadores e parlamentares a Bolsonaro desvirtuou a finalidade do uso de prédios públicos, com o objetivo de alavancar sua candidatura, configurando o abuso do poder político. Aponta ainda que o ex-presidente recebeu no Palácio da Alvorada diversos artistas, com o claro intuito de realizar propaganda em favor de sua campanha.
Ele enumerou seis eventos realizados nos dois Palácios, entre os dias 3 e 17 de outubro, após o primeiro turno das Eleições 2022: encontros com governadores de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Distrito Federal, Paraná, Roraima, Goiás, Acre, Mato Grosso, Rondônia e Amazonas, bem como almoço com artistas e cantores sertanejos no Palácio da Alvorada, com a presença de Gusttavo Lima, Leonardo, Chitãozinho, Fernando Zor, Zezé di Camargo e Marrone.
Ainda segundo o advogado, nas referidas ocasiões, foram concedidas entrevistas coletivas, nas quais políticos e artistas declararam apoio à reeleição de Jair Bolsonaro. Para ele, isso afasta a ideia de que as reuniões tenham sido realizadas para tratar de assuntos privativos do cargo de presidente da República.
- Alegações da defesa
O advogado de defesa sustentou que a regra do artigo 73, parágrafo 2º, da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/1997) permite a “realização de contatos, encontros e reuniões pertinentes à própria campanha”, o que afasta a conduta vedada. Ele também destacou que a recepção aos governadores ocorreu na parte externa do Palácio do Planalto, voltada para a rua e de livre circulação, o que poderia ocorrer na frente de qualquer residência ou local de trabalho.
Além disso, segundo ele, a acusação se encontra lastreada unicamente em matérias jornalísticas, que não permitem concluir que os prédios públicos foram utilizados para a realização de propaganda eleitoral. E ressaltou, por fim, que as manifestações das personalidades que visitaram e emprestaram apoio político a Jair Bolsonaro aconteceram no exercício do direito à liberdade de expressão, de forma singela e espontânea, inexistindo, portanto, qualquer benefício no fato de o candidato ter recebido apoios políticos naturais e orgânicos em seus ambientes de trabalho e de residência.
BA, DV, MC/LC, DM
Processos relacionados: Aije 0600828-69.2022.6.00.0000, Aije 0601212-32.2022.6.00.0000 e Aije 0601665-27.2022.6.00.0000