Moraes participa de debates sobre democracia no contexto das plataformas digitais
Nesta sexta (31), o presidente do TSE participou da abertura de eventos na USP e na Fundação Fernando Henrique Cardoso
Por que aquilo que não pode ser feito no mundo real pode ser feito no mundo virtual? A questão foi levantada pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, na abertura do seminário Democracia e Plataformas Digitais, realizado nesta sexta-feira (31), em São Paulo (SP), pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FDUSP). O ministro reforçou que o ambiente digital não pode ser uma terra sem lei e que a grande batalha da democracia é contra a desinformação.
Moraes destacou que o debate sobre o assunto deve partir de algumas premissas. A primeira delas é que liberdade de expressão não é liberdade de agressão, não é liberdade de ofensa nem de ameaças. Para o ministro, esse discurso de que querem acabar com a liberdade de expressão é uma narrativa construída pela extrema direita no mundo todo, porque é um discurso fácil.
A segunda premissa é que tal abordagem não é aleatória e tem método. “Foi verificado que as redes sociais eram um novo caminho de comunicação de massa sem controle. A extrema direita percebeu que isso era um mecanismo que poderia ser tomado e, com muita competência, começou a tomar conta, criando narrativas, porque percebeu que não havia controle”, explicou.
Grupo de Trabalho
Durante o debate, o ministro pontuou algumas ações do TSE nas Eleições 2022, inclusive com a publicação de resolução, e a iniciativa do Tribunal em criar um Grupo de Trabalho com representantes das plataformas para chegar a uma proposta comum de autorregulação e de regulação a ser levada como contribuição ao Projeto de Lei (PL nº 2.630/2020) debatido pelo Congresso.
“Dentro dessa ideia, as primeiras propostas debatidas são: o que for impulsionado, o que for monetizado, o que a big tech ganharia em cima, ela é responsável. O que tiver o papel de acionamento das big techs, elas imediatamente seriam responsabilizadas. Isso é muito mais eficiente do que querer definir fake news de forma abstrata”, explicou.
Moraes informou ainda que outra questão importante é sobre a necessidade de uma maior transparência nos algoritmos. Segundo ele, nesse ponto, obviamente há um interesse econômico. “Se é um meio de ganhar dinheiro, sai a ideia de que as plataformas são meros depositórios intermediários de conteúdo”, afirmou.
Sobre o Grupo de Trabalho, o presidente da Corte Eleitoral destacou que não é favorável a uma regulamentação ponto a ponto, primeiro porque quanto mais pontos houver, mais ineficiente será, e, desta forma, as prioridades não são atacadas. Segundo, porque o modelo das plataformas é um modelo de negócio diferenciado, que não pode ser banido.
Colaboração das plataformas
O ministro fez questão de reforçar o caráter colaborativo das redes sociais e destacou que não pode apenas criticá-las. De acordo com ele, nas Eleições 2022, as redes foram extremamente cooperativas com o Tribunal. Algumas delas apresentaram relatórios que mostraram que, enquanto havia cerca de 150 decisões judiciais para retirar conteúdos, algumas plataformas, na autorregulação, bloquearam cerca de 6.500 publicações.
Para Moraes, é preciso chegar a um entendimento comum entre o poder público e a iniciativa privada. “As plataformas também têm o entendimento de que, a médio e longo prazo, a continuidade dessa instrumentalização das redes por esses extremistas ou o discurso de ódio, tudo isso pode levar à própria destruição das redes. As visões são diversas, mas é cooperativa”, disse.
Outra medida sugerida pelo ministro para o Grupo de Trabalho é que alguns tópicos, como discursos de ódio, de atentado à democracia, nazismo, entre outros, recebam o mesmo tratamento que as redes dão para temas como pornografia, pedofilia e direitos autorais, com remoção imediata de conteúdos.
De acordo com o ministro, a proposta é chegar a quatro ou cinco medidas que, sem pretensão de dizer que resolveriam tudo, trariam um maior equilíbrio. “Daqui a sete ou dez meses, a gente avalia o que deu certo e o que é possível melhorar. Mas, certamente, isso acaba com a irresponsabilidade total que existe nas redes sociais”, reforçou.
Além do ministro, a abertura do evento, que teve como tema “Liberdade de expressão, limites e alternativas em tempos de pós-verdade”, contou com a participação de diretores da FDUSP Celso Fernandes Campilongo e Ana Elisa Liberatore Bechara e de Eugênio Bucci, docente na Escola de Comunicações e Artes da USP.
Defesa da democracia
Ainda na manhã de hoje, o presidente do TSE participou de evento realizado pela Fundação Fernando Henrique Cardoso, em São Paulo. Convidado a falar sobre defesa da democracia, ele relembrou que os ataques antidemocráticos ocorridos no dia 8 de janeiro foram articulados por meio das redes sociais, e que a extrema direita “capturou” as mídias com a clara finalidade de quebra das regras democráticas.
“Foram feitos ataques aos três pilares da democracia, corroendo, por dentro, a liberdade de imprensa, eleições livres e Judiciário independente e autônomo”, avaliou o ministro. No entanto, segundo apontou, os mecanismos de defesa da democracia impediram que esses ataques fossem bem-sucedidos. Moraes ressaltou que é preciso aprender com o que aconteceu e aprimorar esses mecanismos a fim de que a democracia permaneça “para sempre”.
Participaram desse debate Celso Lafer, presidente da Fundação FHC; a advogada Denise Dourado, diretora regional da Artigo 19, organização internacional que defende a liberdade de expressão e informação; Oscar Vieira, professor da FGV Direito SP e conselheiro da Fundação FHC; e Sérgio Fausto, diretor da Fundação FHC.
MM, JL/CM, DM