Em live com o presidente da OAB, Barroso discute voto impresso e representatividade política
Debate também abordou outros temas, como desinformação, democracia e políticas de combate às drogas
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, participou nesta quarta-feira (26) da segunda live do programa “Papo em Ordem”, transmitida pela página no Instagram do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. A conversa tratou do processo eleitoral brasileiro com vistas às Eleições Gerais de 2022 e temas correlatos.
A discussão em torno da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê a adoção do voto impresso no Brasil foi o primeiro tópico discutido. Felipe Santa Cruz lembrou do episódio em que foi necessária a anulação de uma eleição no estado do Rio de Janeiro, ainda no começo da década de 1990, por conta das alegações de fraudes. Barroso disse acreditar que a implantação do voto eletrônico conferiu lisura ao processo eleitoral, sendo um passo para a maturidade da democracia brasileira.
“Nunca se documentou um episódio de fraude no Brasil de 1996 [quando começaram a ser utilizadas as urnas eletrônicas] até hoje. Nós não temos nada a esconder, pelo contrário. Precisamos dar toda a transparência possível ao processo eleitoral”, disse o ministro, ao citar que o TSE criou uma comissão externa multidisciplinar, envolvendo representantes de diversas universidades, entidades de tecnologia, órgãos públicos e OAB para acompanhar as Eleições 2022 desde o desenvolvimento dos primeiros programas.
Barroso lembrou a experiência malsucedida das Eleições de 2002, em que foi experimentado o voto impresso em algumas cidades do país. Os problemas técnicos nas impressoras, as enormes filas que se formaram e a demora na votação marcaram aquele pleito, o que justificou o abandono da impressão do voto. Além disso, ele frisou que o voto impresso nas próximas eleições custaria mais de R$ 2 bilhões aos cofres públicos, um gasto inoportuno na atual conjuntura econômica do país, bem como traria grandes desafios de logística. “É a solução errada para um problema que não existe”, concluiu.
Para o presidente do TSE, a medida acabará acarretando também um aumento da judicialização dos pleitos, porque qualquer candidato que discorde do resultado das urnas poderá exigir a recontagem manual dos votos – o que abre brecha para a ocorrência de fraudes, como se via no tempo do voto em cédula.
Representatividade política e desinformação
Luís Roberto Barroso disse que o sistema eleitoral brasileiro de representatividade proporcional é caro e ineficiente, pois os candidatos precisam fazer campanhas muito dispendiosas para se eleger. E, em razão do voto proporcional em lista aberta, o eleitor se desvincula dos candidatos que efetivamente tomam posse nas casas legislativas do país. “No final do dia, o eleitor não sabe quem o representa, e o candidato não sabe por quem ele foi colocado lá”, observou o ministro.
Assim, ele defendeu o modelo do voto distrital misto, no qual o eleitor vota num candidato do distrito em que mora e num partido político. Isso possibilitaria campanhas menores, localizadas e mais baratas, a proximidade e relação direta entre eleitores e eleitos, além da preservação do voto ideológico por meio do voto na agremiação.
Para Barroso, a ascensão de um populismo extremista em diversos países tem sido a principal engrenagem que produz notícias falsas e teorias conspiratórias. Citando o sucesso do Programa de Enfrentamento à Desinformação com foco nas Eleições 2020, ele destacou que a agilidade na divulgação de conteúdo autêntico para desmentir o falso é essencial. “Numa democracia, a verdade não tem dono, mas a mentira deliberada tem. E essa nós precisamos combater”, disse.
Educação
O presidente do TSE ainda afirmou ter percebido que atualmente a ciência e as entidades comprometidas com a produção de conhecimento não têm sido valorizadas. Ele disse acreditar que não há civilização sem educação, de maneira que não haverá um país melhor se não for feito um investimento importante em educação básica. “Temos que manter acesa a chama do conhecimento e do respeito pelo outro. A democracia tem espaço para liberais, progressistas e conservadores; só não tem lugar para a intolerância, a agressividade e a inaceitação do outro”, ressaltou.
Barroso ainda defendeu que os ataques às instituições democráticas brasileiras nas ruas e na internet precisam ser notados e respondidos. Ele disse não acreditar que a democracia corre agora um risco como correu no começo da década de 1960, mas isso não significa que se possa “baixar a guarda”. Parafraseando uma música da Legião Urbana, ele exemplificou: “Não tenho medo do escuro, mas deixo a luz acesa”.
Evolução da sociedade
Citando a campanha para incentivar a participação feminina na política, Barroso apontou que o machismo que ainda se vê nos comportamentos e nos valores é um dos sinais de que ainda há muito a se evoluir enquanto sociedade na busca por uma efetiva igualdade de gênero. “Falta agora às mulheres ocupar o espaço que lhes cabe na vida pública”, disse.
Perguntado sobre como imagina o cenário pós-pandemia de Covid-19, o ministro disse crer que algumas inovações vieram para ficar, como as reuniões por videoconferência, que, segundo ele, poderão facilitar muito a vida dos advogados. Contudo, para Barroso, as sessões nos tribunais e as aulas devem voltar ao modelo presencial assim que possível.
Confira a live no IGTV.
RG/LC, DM